domingo, 13 de setembro de 2009

Os labirintos de Elza

Parte IX


Após voltar, passaram-se mais alguns dias até eu receber um breve telefonema de Elza e, no dia seguinte, a sua segunda carta. Nesse hiato de tempo, cheguei a pensar se valeria a pena continuar a alimentar alguma esperança de futuro junto a Elza. Mas, algo de inexplicável e profundo em mim, me impulsionava ir adiante. Ainda mais, que, Elza, embora dissesse nessa carta declinar, desculpando-se, de aceitar meu convite para um jantar, e deixar claro que isso seria maravilhoso acontecer, marcou nosso próximo encontro.
Sem nada mais acrescentar, ela disse que, no sábado seguinte, estaria na mesma hora e no mesmo lugar no qual, segundo eu lhe dissera, eu a havia visto pela primeira vez: no lugar, portanto, na rua, onde eu a vira brevemente refletida no espelho de uma vitrine.
Como daquela vez, quando estava ávido por rever meus amigos após uma longa ausência, dirigi-me ao mesmo lugar com quase meia hora de antecedência, desejoso de não fazê-la me esperar. Não foi preciso. É como se tivéssemos combinado isso: ao ir me aproximando do exato lugar onde deveríamos nos encontrar, vi Elza que vinha ao meu encontro. Estava radiante, vestida com encantadora leveza, e sorria lindamente. Parecia transbordar felicidade ao ver-me. Foi natural e denso o impulso que tive de ir rápido ao seu encontro, envolvê-la com meus braços, e beijá-la apaixonadamente. Mas, foi Elza quem conduziu esse encontro. Com naturalidade, estendeu-me a mão para um formal cumprimento. Talvez por brevíssimo instante eu tenha deixado transparecer decepção. Então, acolhi sua mão, macia, morna, ligeiramente úmida, e a retive entre as minhas mãos, meus olhos nos seus olhos que brilhavam, talvez de contido arrebatamento. Levemente eu a atraí para mim, para beijá-la. Elza ofereceu-me suas faces, às quais beijei, e aspirei seu inconfundível perfume.
Caminhamos pela rua que naturalmente era fechada ao trânsito de veículos. Tudo o mais parecia ter deixado de existir: as lojas, as pessoas que iam e vinham, os sons vindos de todos os lugares. Conversávamos sobre coisas, coisas que pareciam não pertencer a um passado, nem depender de um futuro, e isso era delicioso. Por fim, nos sentamos a um dos muitos bancos dispostos ao longo da rua, e protegido do sol da manhã. Ficamos ali, por longo tempo.
Tomamos um sorvete que eu fora buscar em um estabelecimento próximo dali; nos lambuzamos um pouco, e ríamos, felizes.
Foi Elza quem lembrou que naquele sábado deveria estar acontecendo a feira quinzenal de plantas e flores onde nos falamos pela primeira vez. Rumamos para lá. Como
Elza, as flores estavam radiantes. Em uma banca onde percebi que as rosas pareciam mais belas, pedi reservadamente à senhora que me atendeu para preparar um buquê com muitas rosas vermelhas, e disse-lhe confiar que o buquê fosse feito com o melhor dos esmeros, apontei Elza que se distraia olhando uns vasos um pouco adiante. A mulher disse ter entendido, e o faria muito especial.
Quando Elza recebeu o buquê de rosas pouco depois, realmente maravilhosos, pareceu desfazer-se em incontida felicidade. Estávamos bem ao lado de um recipiente que continha apenas rosas brancas. Em um impulso, recolhi aquela que achei ser a mais perfeita entre todas, beijei-a, e entreguei para Elza que a acolheu, olhou-a intensamente, beijou-a, acariciou-a, e a colocou destacada entre as demais rosas vermelhas do buquê, e parecia flutuar em felicidade que me contagiava. Paguei à senhora que nos atendeu, que falando baixinho, desejou-me felicidade. Pouco depois passamos pela banca de onde, no primeiro encontro, eu recolhera o vasinho com violetas e o dera para Elza. Ela foi quem se lembrou disso, e disse-me que o vasinho transbordava flores brancas, e que de três folhas mais velhas havia reproduzido a planta, e que a primeira delas logo estaria florindo.
Aproximava-se o meio dia, e pensei ser natural almoçarmos juntos. Convidei-a. Elza repetiu aquele seu gesto de olhar para lugar algum, refletir, e dizer-me que precisava ir para casa. Não retruquei, não insisti, e a acompanhei até um ponto de taxi que ficava próximo de onde estávamos. Abri-lhe a porta. Antes de entrar no taxi, Elza aproximou a rosa branca dos seus lábios, beijou-a, e segredou-me que cuidaria para que essa rosa durasse mais que todas as outras. Beijamo-nos nas faces. Elza entrou no taxi. Enquanto eu fechava a porta, ela olhava-me feliz, e agradecia pela bela manhã que tivera.
Depois, novamente, fiquei olhando o taxi se afastar, e dobrar uma esquina. Fiquei ainda parado alguns instantes; e veio-me o pensamento de que Elza rumava para um seu mundo por mim ainda desconhecido, e mergulhado em densas névoas de mistério.

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