sexta-feira, 13 de junho de 2008

No rabo do cometa

Dá-me uma crença e eu morrerei por ela.

Calma, que não o digo por mim.

Há poucas coisas nas quais acredito e pelas quais eu estaria disposto a morrer, se preciso fosse. Entre elas: a Vida, a Luz, a Paz. Nas duas últimas, a minha crença é incondicional. Já a vida, se ela um dia dependesse da minha própria vida para ser perpetuada, e se houvesse a mínima chance de que a vida que subsistisse estivesse ligada às trevas e ao mal, é muito provável que morreríamos juntos.

Talvez isso seja marca dos tempos. Na primeira metade da década em que nasci milhões de pessoas morreram porque alguns homens acreditaram que este Planeta que é berço de tantas e variadas formas de vida pudesse ser Pátria de uma raça que fosse superior às demais raças de homens. Segundo essa crença, a raça supostamente superior estaria destinada a constituir um império que duraria um milênio. As mentes que acreditaram nisso não souberam ler na História a história de tantos impérios que floresceram e murcharam, cada qual na velocidade do seu tempo. Não souberam perceber que a partir da Revolução Industrial, outra velocidade foi implementada no mundo, e esta acorreu com homens que pensaram diferente, para sufocar a semente de erva daninha que se insinuou germinar.

Os anos seguintes assistiram aos assassinatos em massa, concepção de uma guerra fria sustentada por crenças em ideologias diversas. E também genocídios, quando etnias sufocaram e mataram etnias, devido a crenças em direitos de sangue.

Homens mataram e morreram porque houve a crença no lema: Liberdade, Igualdade e Fraternidade.

A todo instante alguém está morrendo porque acredita em alguma coisa, seja essa coisa boa ou má.

Pensei em dizer isso, e não foi do nada. O digo – e aí está o perigo – porque me convenço cada vez mais de que não há coisas consumadas como verdades, pelas quais se possa apostar a vida. Ela, a Vida, não é moeda de troca banal.

E lembra-me a passagem por estas paragens cósmicas, no ano de 1997, do cometa Hale-Bopp.

Doze anos antes, aventurou-se por cá o cometa Halley. Há muitos anos atrás, deste ouvi falar por primeira vez e se dizia que sua volta ocorreria no ano de 1985. Diziam que ele produziria um belo espetáculo nos céus escuros, possivelmente dominando o cenário sideral. Passei a querer estar vivo nesse momento. O espetáculo celeste prometia ser fascinante, e eu teria um cometa na minha vida. Não tive, até hoje, pelo menos. O Halley veio, e sua passagem foi um fiasco cósmico monumental. É um corpo celeste fadado a desaparecer.

O outro, o Hale-Bopp, também não foi nenhum deslumbre como clarão gravitacional. Passou e, como tantos outros cometas na História, deixou histórias. Em uma delas – isso foi notícia naqueles tempos de final de século – 39 pessoas acreditaram em algo, e aceitaram morrer para, morrendo, serem os primeiros na fila de embarque em uma suposta nave espacial pousada ou escondida na cauda desse cometa e, supostamente, serem levados a outra dimensão de vida. Foi consternador ver de relance as imagens dos corpos daquelas pessoas, a maioria entre 35 a 55 anos, que aceitaram morrer porque um doido qualquer os convenceu a embarcarem na canoa furada feita de poeira, gases e gelo estelares, que é todo cometa. Mortos estão, pois que acreditaram em algo.

Assim é a maioria das coisas nas quais se acredita: poeira e gelo que se desfaz.

E o frio? Como é fria a existência daquele que facilmente decide morrer por uma crença feita apenas de crendice.

3 comentários:

Ju disse...

caraca... que texto dednso, profundo!
qual crença e ideologia valem mais que a vida? não há...
beijos, muita luz.

Carla disse...

gostei imenso de ler esta tua visão da realidade
beijos de boa semana

Alice Matos disse...

Na realidade também não aceito verdades feitas dogmas pelos quais morrer... A nossa verdade vai crescendo, vai-se moldando com o decorrer da vida... é algo em construção... A vida vai-se gastando em busca da verdade em construção...

Um beijo para ti...